José Lemos
Engenheiro Agrônomo.
Professor Associado da Universidade Federal do Ceará.
Um dos grandes desafios da humanidade é a construção de uma sociedade mais justa e que respeite os limites da capacidade de suporte da terra sem agredir o nosso planeta. Esta não se constitui uma tarefa fácil, a julgar pelas prioridades dos modelos econômicos hegemônicos que privilegiam a produção incessante de mercadorias, muitas de utilidade duvidosa, em detrimento das precauções acerca da forma em que esses bens são produzidos e induzidos aos consumidores. Propagandas maciças criam “necessidades” pelo consumo de mercadorias que, muitas vezes, foram criadas mais para incrementar as riquezas de quem as produziu do que agregar conforto ou bem-estar para quem as adquire.
Nesta perspectiva o Livro “O Ponto de Mutação” de Fritjof Capra, dos meados dos anos oitenta, traz uma reflexão crítica acerca dos argumentos justificadores dessa forma de promover o crescimento econômico de qualquer forma, descuidando dos limites impostos pela disponibilidade dos recursos naturais. Capra sugere que o desfecho de tal processo só poderia ser estes que estão sendo denunciados, inclusive pela ONU, de cujos quadros saíram os ganhadores do Prêmio Nobel da Paz em 2007, com uma obra mostrando os danos para o meio ambiente provocados por esta forma de condução do progresso econômico. Capra sugere uma forma diferente de encaminhamento desse progresso, preservando mais os recursos naturais, o ambiente e respeitando o ser humano. Para tanto, ancora-se numa vasta lista de autores para mostrar que o encaminhamento cartesiano das propostas de produção e distribuição da riqueza gerada no planeta são as causas primárias do atual processo desigual em que sobrevive a humanidade. Assimetria que possibilita a uma pequena proporção da população rica, que vive nos países industrializados e nos países pobres, deter padrões faustosos de consumo e de desperdício, inclusive de água potável, enquanto dois bilhões (30%) da população do planeta, segundo estimativas recentes da ONU, não têm acesso a água e a saneamento. Isto sem falar que existe praticamente um bilhão de famintos num mundo em que a produção de alimentos ainda é abundante.
Essas concepções prevalecentes de apropriação dos ativos econômicos e do pensar de forma reducionista, desconhecendo que a equação universal é holística, também estão nas raízes do problema. O raciocínio prevalecente é que o todo sempre representa a soma das partes, e também por isso não se exercita um planejamento global, onde a economia deveria ser entendida como parte de um sistema complexo que envolve seres bióticos e abióticos que interagem, e de cuja sinergia dependerá a vida saudável no planeta. O pensar holístico nos parece se constituir num requisito importante para o desenho dessa nova sociedade. Mas não apenas isso, devemos partir para intervenções locais, focadas no objetivo maior, mais amplo, global. Apreender as lições de Alain De Janvry que, ao propor ações em zonas de pobreza rural, sugere que os impactos das intervenções nessas áreas geram ao menos três externalidades positivas: efeitos transbordamento, ecológico e social, implicando que o todo, nesses casos, será bem maior do que a soma das partes. Programas e projetos de mitigação da pobreza que envolvam os sujeitos sociais diretamente atingidos na concepção, desenho e execução, se constituem nos pontos essenciais para que possamos conseguir melhores resultados globais.
Na metade dos anos setenta, Schumacher escreveu o livro “Small is beautiful” (O Importante é Ser Pequeno) em que mostra as vantagens dos pequenos projetos e negócios na construção de uma sociedade mais justa. Na avaliação desse autor, os mega-projetos são socialmente segregadores e provocam externalidades negativas, na medida em que pressionam o consumo de energia não renovável e dos demais recursos naturais. Provocam poluição via eliminação de efluentes para a atmosfera, solo e para os corpos de água, além de promoverem a concentração da renda e da riqueza. Nesses casos o todo é menor que a soma das partes.
Uma lição importante extraída do livro de Capra é esta: pensar de forma holística e agir localmente em sintonia com metas globais, priorizando projetos e programas de pequena escala. Lição simples, mas ainda não adotada no mundo porque contraria interesses de fortíssimos grupos econômicos, como aqueles das grandes companhias petrolíferas, apenas para ficar num dos setores mais poderosos no mundo.
(Publicação simultânea com o jornal O Imparcial, de São Luís MA)
sábado, 24 de novembro de 2007
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